terça-feira, 18 de junho de 2013

Fronteira é a primeira pessoa do singular

Da categoria: Livros do caralho (para ser dito em voz alta e com sotaque de São Paulo)


Javier Cercas é daqueles escritores que não regressa, até porque nunca foi a lado nenhum. Vive na mesma rua de sempre, lado a lado com Flaubert, Bolaño e Vila-Matas, isto só nos números ímpares.
Neste Las leyes de la frontera (2012; Literatura Mondadori) mistura-se ficção com farsa. Logo, procura-se a realidade. Naquilo que aparenta serem as entrevistas de um escritor para recolher material para um novo livro, isso é o livro.
A acção decorre em 1978, num bairro periférico de Gerona, povoado por pessoas periféricas, quando a imberbe democracia sonhava ainda humidamente com Franco.
Gafitas, o narrador maioritário, menino de classe média e 'bullyngofóbico', vê no grupo de Zarco, formado por delinquentes profissionais, a oportunidade de se imiscuir. A oportunidade surge num felácio executado pela delinquente Tere, no WC do salão de jogos Vilaró. A vontade de se integrar veio de imediato: todo ele queria integrar-se ou, pelo menos, parte.
Naquilo que poderia ser um livro de aventuras, de romantismo delinquente, de tonteria adolescente, rapidamente se transforma no inverso. As personagens tornam-se reais por nos apresentarem a sua realidade, permitindo ao leitor apanhá-las nas suas mentiras. E faz-nos pensar na famosa frase de Dr. House: "Everybody lies". E quem mente são as personagens através das verdades de Javier Cercas. Neste caso, se calhar não mentem. Olham para a realidade com a miopia do entendimento individual.
E mais não digo, por duas razões: os livros bons não merecem resumos senão o texto integral; o Javier Cercas merece críticos que não vivam em savanas.
Um livro que devia ser acompanhado com aqueles óculos para ver o Avatar, mas com mais graduação, até porque estas personagens são mesmo tridimensionais.


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Acerca de Las leyes de la frontera, veja-se:
http://www.eldiario.es/catalunya/diaricultura/cultura-literatura_6_117998214.html

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