quarta-feira, 27 de maio de 2015

Salvar ou não salvar Palmira

Houve uma altura na minha vida em que, tal como o Estado Islâmico, sonhei com a destruição de Palmira. Não da cidade, mas da D. Palmira.
A D. Palmira era patroa da minha mãe, das minhas duas tias e da minha avó. Trabalhavam todas na lavandaria Sol em Aveiro.

Durante muitos anos, assisti a conversas acerca de aumentos de salários que nunca chegaram a aparecer. No entanto, tudo mudou quando a D. Palmira expandiu o negócio das lavandarias para o das igrejas. Decidiu abrir uma igreja evangélica na rua do Carmo, que ainda hoje existe. No fundo, era um negócio que estava na mesma linha. Quem acreditava no milagre da limpeza a seco, podia muito bem aceitar gravidezes sem cópula.

O que aconteceu de seguida foi surreal. A D. Palmira reuniu a equipa toda e anunciou aumentos para quem abraçasse a nova fé. E não era uma fé qualquer; esta vinha com sotaque de português do Brasil. O pastor Erivaldo tinha vindo de Minas Gerais com o apodo de espiritualista de grau avançado na óptica do utilizador, curandeiro e licenciado em berimbau.
Estava instalada a dúvida. A família dividia-se entre católicos e protestantes, mas sem os problemas da Irlanda. Bem, a única semelhança era o alcoolismo do meu avô. O acréscimo no ordenado permitia uma melhoria significativa de vida, que é o mesmo que dizer: finalmente podia ter o He-Man que andava a pedir há quase dois anos e deixar de ser gozado na escola por ter apenas a She-ra e o seu cavalinho azul-bebé.

A minha avó e as minhas tias aderiram. Tiveram um aumento. O que não sabiam é que tinham que deixar 10% do ordenado todos os meses na nova congregação e acabavam por trazer menos dinheiro para casa. A juntar a isso, a minha tia mais nova desmaiava quase sempre nas reuniões semanais, por não sei quê da fé e teve uma contusão craniana que lhe levou o resto do ordenado durante dois meses. Acabou por abandonar esta fé, que era muito boa ao nível do espírito, mas causava-lhe muitas dores de cabeça.

Eu fiquei a odiar a D. Palmira porque não consegui o He-Man tão desejado. Tive uma versão barata do Skeletor, cuja cabeça brilhava no escuro. Isto fez com que deixasse de dormir durante 3 meses e o único boneco que me podia salvar era a She-ra e o seu estúpido cavalo azul-bebé.

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